quinta-feira, 24 de julho de 2008

Um Pai muito fora do comum...








Como prometi vou falar um pouco do meu pai,que morreu há 44 anos de um ataque cardíaco fulminante enquanto dormia,tinha eu 25 anos e 2 filhas na altura.
Este é o Porto da sua cidade Natal onde nasceu em 5 de Abril de 1896.
Pouco sei da sua família apenas que a sua mãe se chamava Kalothetina Galanos e o pai Theófilo Pappamikail.Sempre ouvi falar das irmãs uma Maria que era a mais velha,doutra que morreu com 18 anos e tinha o meu nome e dos irmãos George cuja filha Irene e a neta Argyro vim a encontrar em Londres onde viviam ,aos 15 anos quando estive num Colégio interno e com quem passava alguns fins de semana.Sei que correu vários países incluindo Moçambique até se fixar aqui por volta dos anos 30.Foi Cônsul Geral da Grécia durante a Guerra,numa altura em que não havia ainda Embaixada.Daí que eu tenha a dupla nacionalidade como os meus irmãos,embora não a utilize.Tinha 43 anos quando eu nasci, podia ser meu avô , sempre o conheci mais velho que os pais dos meus amigos, mas a idade dele deu-me sempre um grande sentimento de segurança e a ideia parva de que nunca o perderia.

A história dos meus pais com 18 anos de diferença entre eles, dava um romance com algumas rosas mas muitos espinhos e dado que a minha mãe agora com 93 anos ainda é viva, por uma questão de respeito pela sua privacidade não a contarei aqui.
Ainda tenho algumas recordações dele em diversas ocasiões da minha vida, embora dado que não vivia comigo não serão tantas quanto eu gostaria.
Mas no geral são positivas.Como esta foto por exemplo tirada em 1944 no terraço da casa da Rua Emília das Neves em Benfica ,onde actualmente moro com a minha mãe, muito perto desta rua onde se mantem a moradia.
É actualmente uma Clínica de Cães no r/c, nós morávamos no 1ºandar.
Dizem que sou parecida com ele, que acham?
Lembra-me que em vez de histórias infantis me sentava ao colo e me contava histórias da Mitologia Grega.E não é que as fixei!Sou mesmo barra no assunto.
Nessa altura do campeonato dava-me com as amigas e os seus irmãos, mas quando comecei a crescer acabaram-se os convívios com amigos doutro sexo.

Será que a educação pelos invasores turcos, lhe criou essa mentalidade de ciume doentio em relação às mulheres da família? Ou será que eram costumes atrasados das Ilhas?
Não sei,mas na adolescência, tudo tinha que ser feito às escondidas dele, na perspectiva que ele podia aparecer e zangar-se, com actividades tão inocentes como bailaricos em casa uns dos outros, jogos tipo Monopólio, passeios, convívio na praia.
Foi terrível e levou a que eu me tivesse casado aos 18 anos para me ver livre da prisão e meter-me noutra.

Nunca me faltou com nada, mas nem eu nem os meus irmãos pensámos alguma vez que ele era rico, fruto do seu trabalho, porque a nossa vida era igual à dos outros, com algumas excepções, como termos os primeiros giradiscos que houveram em Portugal, por ter a sua representação , os professores de tudo e mais alguma coisa em casa, as estadias no estrangeiro em Escolas, tendo-me pago, até depois de casada a Estadia de um mês em Bonn na Alemanha na Universidade Local, para aperfeiçoar o meu alemão.

Era assim com a Cultura,um mãos abertas! Tinhamos conta nas Livrarias e comprávamos o que fosse preciso para os nossos estudos.Deu-nos uma educação esmerada, que eu já não pude dar aos meus filhos.Falo no estudo da música, da pintura, dos bordados, da culinária,das línguas(aí também dei a possibilidade aos meus) e eles são quase todos artistas inatos em campos diversos.
Ele mesmo pintava muito bem, desenhava, esculpia e dava-se com toda a boémia de Lisboa no Café Chiado, sobretudo escritores e pintores.

Ajudou a muitos, era muito generoso, pois perdoou dívidas a amigos seus no Testamento que deixou. Teve no seu funeral, muita gente anónima que o conheciam da Baixa onde eram os seus escritórios e lhe deviam favores.

Era um bom patrão, mal sabia ele que a sua herança ia ser desbaratada por um dos filhos deixando os outros sem nada e os seus empregados de muitos anos na rua.Se eu não tivesse o meu emprego no Banco teria ficado sem meios para criar os meus filhos.
Toda uma vida desafogada que o nosso pai planeou para nós e beneficiámos durante alguns anos,foi por,água abaixo ,já que embora tendo recorrido aos Tribunais, nunca vimos até hoje um cêntimo dos nossos bens, desviados para o estrangeiro pelo nosso irmão, entretanto falecido inesperadamente em 1990.

É neste aspecto que lamento que o meu pai não me tenha deixado viver e crescer na altura própria deixando-me vulnerável a um mundo que eu julgava constituído só por pessoas boas.

Essa sua obsessão por nos proteger, teve consequências funestas no futuro, pelo menos para mim, levei anos e anos de auto estima nula,
trouxe-me um divórcio aos 30 anos ,uma relação tempestuosa de cerca de 30 anos com o pai das minhas filha mais novas, e um desconhecimento fatal de como lidar com os homens que me trouxe muitos dissabores.
Em muitas ocasiões senti o quanto ele me fazia falta, não obstante o C.sendo mais velho que eu 10 anos,tenha em parte preenchido essa lacuna.
Querido Pai,nunca te esquecerei...

1 comentário:

Alexa disse...

O seu pai devia ser, de facto, uma pessoa fora de série, Musa! :)